22 de Junho de 2007.
Cantado em prosa e verso, o São Francisco, o “Velho Chico”, é dos mais pródigos rios nacionais. Com 2800 quilômetros, nascendo na Serra da Canastra, em Minas Gerais, desemboca no Atlântico, entre Alagoas e Sergipe, depois de passar por Bahia e Pernambuco. É naturalmente navegável entre Pirapora (MO) e Juazeiro (BA), passando pela barragem e eclusa de Sobradinho. Interrompida a navegação pela barragem de Paulo Afonso, sem eclusa, retoma a navegação em Piranhas (AL), até a foz, no Atlântico. Além da navegabilidade, o São Francisco empresta suas águas para bem sucedidos projetos de irrigação, como na região de Petrolina (PE), que é hoje excelente pólo frutífero de exportação, produzindo até vinhos. Isso mostra como o solo do Nordeste pode ser bem aproveitado quando convenientemente irrigado.
Mas o grande projeto ligado ao São Francisco é o uso do excedente de suas águas jogadas fora, sem aproveitamento, no Oceano Atlântico. E não é pouca quantidade. Depois de passar as hidroelétricas em seu caminho – hidroelétricas não “comem” água – despeja no oceano cerca de 2.100m³/seg de água doce. O projeto conhecido como transposição das águas do São Francisco – que melhor chamaria de desvio de águas - não é novo. Já em 1847 o engenheiro cearense Marcos de Macedo apresentava ao imperador Pedro II o plano desse desvio para resolver o problema da seca do Nordeste. Nada se fez.
Mas em que consiste o projeto e quais as suas conseqüências e benefícios? Começa com uma tomada d’água à altura da cidade de Cabrobó (PE), pouco abaixo da barragem de Sobradinho. Pretende-se que uma quantidade ínfima das águas, 80m³/seg, menos de 10% (dez por cento de um total de 2100m³/seg de água doce jogadas ao mar, sejam elevadas à altura de 170 metros por sistemas de elevatórias, adutoras, canais e túneis, para transpor a Chapada do Araripe, na divisa de Pernambuco com o Ceará. Não há nenhuma dificuldade, sob o ponto de vista da engenharia nacional, para a execução. A partir daí, as águas passam a correr por gravidade nas calhas dos rios Salgado e Jaguaribe, atingindo o açude do Castanhão, em construção, com capacidade de acumulação maior que a Baía de Guanabara. Várias derivações estão projetadas desta calha principal para atender Pernambuco, Paraíba e Rio Grande do Norte. Alguns números: a população beneficiada será de mais de 10 milhões de habitantes, com geração de mais de 1,5 milhão de empregos, propiciando uma superfície irrigada de 600 mil hectares. A produção anual com esse reforço hídrico, só na agricultura, será da ordem de 4 bilhões de dólares. Quanto ao custo, que se estima na primeira fase de R$ 1,5 bilhão, é plenamente compensatório, uma vez que o governo gasta anualmente, com verbas assistenciais de combate à seca, mais de R$ 2 bilhões. Não cabe no escopo deste artigo o detalhamento desse grande projeto, verdadeira redenção para milhares de nossos irmãos nordestinos, morrendo anualmente de fome e de sede.
Projeto semelhante há na Califórnia. Lá, o desvio do Rio Colorado transformou a Baixa Califórnia – região em que chove menos do que no Nordeste – no pomar da América.
Quando se fala neste país em combater a pobreza cogita-se sempre de medidas assistencialistas que, necessárias em emergências, combatem apenas os efeitos e não as causas da pobreza. O projeto de desvio de parte das águas do São Francisco, este sim, vai direto às causas, levando a milhares de irmãos nordestinos a certeza de uma vida com dignidade e fixação em seu hábitat, prevenindo o êxodo em direção às regiões mais ricas do país. Este projeto é o maior de todos os de combate à pobreza e diminuição dos desníveis regionais entre o Nordeste e o Sul.
Não acredito que quem esteja realmente preocupado com a pobreza no Brasil possa ser contra este projeto. Quanto à vazão do Rio São Francisco, se água faltar para suas necessidades normais, é só desligar bombas da elevatória. Simples programa de computador pode controlar isso. Não há razão para temores por parte de nenhum Estado.