Veremos se Barack Obama tem tanta astúcia quanto retórica. 52% foi sua margem de vitória. Estreita... Com uma oposição em seu encalço terá que solidificar sua base e, na melhor das hipóteses, ampliá-la. Se cair no mesmo erro da dupla Bush/Cheney que governou com uma das metades em 2001 pode não ter o sucesso que se espera dele. Mal ganhou por mais que Bush em 2004. Há muitos que esperam ser nomeados para a Casa Branca, para as agências federais e se não forem contentados podem se tornar amargos opositores.
Se lá por março ou abril retirar as tropas do Iraque, mesmo que parcialmente, abrirá os portões do Inferno, ou seja, para o Irã pintar e bordar no Iraque. E alguns dos que mais protestarão serão os aliados sauditas temerosos do olhar de Teerã sobre seus campos petrolíferos. Não só estes, como outros aliados, particularmente, os turcos e os jordanianos exercerão pressão sobre o presidente americano para evitar a retirada. E, claro, os israelenses. Esta será a primeira prova de fogo para o presidente. Será sábio trair sua retórica flower-power.
Como “construir alianças” se trair desta maneira seus tradicionais aliados? E será deveras difícil driblar a oposição interna se resolver se aventurar numa estratégia totalmente nova. Os europeus comemoram porque acham que os EUA os atenderá a partir de agora. Como convencer os europeus a atuar no Afeganistão? Consultará os europeus e a Otan na nova estratégia? Muitos testes deste tipo terão curso e eu estou curioso para ver como se sairá. Ansioso para falar a verdade e para ver mais um mito do presidente apaziguador cair por água abaixo. Bullshit! Alguns países europeus até poderão fornecer algum sustento as operações no Afeganistão, embora eles não tenham a força requerida e o grosso, como sempre, ficará com os americanos mesmo. Mas, se ele apenas fingiu que é um ‘dialogador’, então, tudo bem. E como a crise financeira, provavelmente, terá um impacto maior na Europa (com bancos menos preparados) do que nos EUA, os europeus já estão se resguardando, no que será difícil enviarem apoio militar a tais áreas conflagradas. A última coisa que querem os europeus agora é aumentar seus gastos, especialmente, em pontos que não lhes dizem respeito diretamente. A solução do diálogo proposto por Obama encontrará uma Europa relutante e dividida. Nada mais difícil e entorpecente para quem quer dividir responsabilidades se fazendo passar por ‘democrático’ em questões geopolíticas. Obviamente, isto levará a um conflito de interesses com os europeus no ano que vem e terá que tomar uma decisão. Será o início do desencanto, para meu regozijo. Como sair em busca duradoura dos Talebãs com aliados tão fracos e sensíveis à opinião pública anti-guerra? Temos ainda a questão do Paquistão, que Obama já cometeu algumas gafes homéricas dizendo que invadiria o país, caso soubesse do paradeiro de Osama bin Laden por lá. Invadir um aliado? Este moço não chega aos pés do Lula na arte da gafe, mas parece se empenhar.
Pode optar em continuar se arrastando no Afeganistão do jeito que vai ou refugar, preferindo o fogo pesado da direita americana. De qualquer forma, uma longa guerra. É só escolher a menos destrutiva. Outra opção, bem menos ortodoxa, é procurar um acordo com o Talebã. Se bem sucedido, realmente, terá inovado não sem atrair ódio e dura oposição no flanco interno. Se resolver levar com a barriga, atrasando a retirada, de qualquer forma, ganhará uma nova frente oposicionista: daqueles que depositaram suas esperanças na sua retórica ilusionista. Seus 52% de apoio se deteriorarão em velocidade alarmante.
Não nos esqueçamos do Urso Russo. Na manhã seguinte após a eleição de Obama, o presidente Dmitri Medvedev anunciou a instalação de mísseis no enclave europeu de Kaliningrado em resposta à operação americana do sistema de defesa de mísseis balísticos na Polônia. Após a intervenção russa em agosto na Geórgia, Obama nunca se declarou claramente contrário à Rússia. A grande questão será ainda o posicionamento da Ucrânia, no que os russos não perderão tempo para desenvolver sua esfera de influência. Militar, diga-se de passagem. Antes que o presidente americano possa se envolver com seus problemas internos, já terá que responder a altura. Se permanecer no nhém-nhém-nhém de buscar alianças com os europeus poderá quebrar a cara bonito.
Torço para que caia na real. Na Realpolitik.