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O presente blog, Geografia Conservadora servirá mais como arquivo e registro de rascunhos.
a.h

Friday, May 23, 2008

A fracassada explicação de Jeffrey D. Sachs


Neste ano, os EUA irão gastar em torno de US$ 800 bilhões com segurança, em comparação com menos de US$ 20 bilhões destinados a desenvolvimento econômico.[1] Jeffrey D. Sachs é professor de economia e diretor do Instituto Terra, na Universidade Colúmbia. É também assessor especial do secretário geral da ONU para o programa Metas de Desenvolvimento do Milênio. Artigo publicado pelo “Valor Econômico”:
Muitas das atuais zonas em guerra - como Afeganistão, Etiópia, Irã, Iraque, Paquistão, Somália e Sudão - compartilham problemas básicos na raiz de seus conflitos.
Esses países são, todos, pobres, vítimas de desastres naturais - especialmente enchentes, secas e terremotos - e têm populações em rápido crescimento que estão pressionando a capacidade do solo de alimentá-los. E a proporção de jovens é muito alta, produzindo crescente juventude em idade militar (15 a 24 anos).
Todos esses problemas só podem ser solucionados por desenvolvimento econômico sustentável no longo prazo. Apesar disso, os EUA persistem em reagir aos sintomas, em vez de atacar as raízes subjacentes do problema, e tentam solucionar cada conflito por meios militares. Os EUA apóiam o exército etíope na Somália. Ocupam o Iraque e o Afeganistão. Ameaçam bombardear o Irã. Apóiam a ditadura militar no Paquistão.[2]
Nenhuma dessas ações militares ataca os problemas que originalmente produziram o conflito. Ao contrário, as políticas americanas normalmente inflamam a situação, em vez de trazer soluções.[3]
Repetidas vezes, essa abordagem militar produz reações que voltam para assombrar os americanos. Os EUA apoiaram o xá do Irã enviando enorme quantidade armamentos que caíram nas mãos do governo revolucionário iraniano após 1979.[4]
Os americanos depois apoiaram Saddam Hussein em seu ataque contra o Irã, até que acabaram atacando o próprio Saddam. Os EUA apoiaram Osama bin Laden no Afeganistão contra os soviéticos, e então os americanos terminaram lutando contra bin Laden.[5]
A partir de 2001, os EUA apoiaram Pervez Musharraf no Paquistão com mais de US$ 10 bilhões em ajuda, e agora defronta-se com um regime instável mal capaz de sobreviver.[6]
A política externa americana é assim ineficaz porque foi apropriada pelo establishment militar. Até mesmo a reconstrução do Iraque no pós-guerra sob a ocupação liderada pelos americanos foi administrada pelo Pentágono, e não por agências civis.[7]
O orçamento militar americano domina tudo o que esteja relacionado com política externa. Somando os orçamentos do Pentágono, das guerras no Iraque e no Afeganistão, do Departamento de Segurança Interna, dos programas de armas nucleares e das operações de ajuda militar do Departamento de Estado, neste ano os EUA irão gastar em torno de US$ 800 bilhões com segurança, em comparação com menos de US$ 20 bilhões destinados a desenvolvimento econômico.
Em espantoso artigo sobre a ajuda ao Paquistão durante o governo Bush, Craig Cohen e Derek Chollet demonstraram a desastrosa natureza dessa abordagem militarizada, antes mesmo da mais recente onda de repressão promovida pelo claudicante regime de Musharraf.[8]
Os autores mostram que, apesar de o Paquistão viver enormes problemas de pobreza, populacionais e ambientais, 75% dos US$ 10 bilhões em ajuda americana foram destinados ao militares paquistaneses ostensivamente para reembolsar o Paquistão por sua contribuição para a “guerra ao terror” e para ajudar o país a comprar caças F-16 e outros sistemas de armamentos.
Outros 16% foram diretamente para o orçamento paquistanês, sem quaisquer questionamentos. Com isso, sobraram menos de 10% para assistência ao desenvolvimento e humanitária. A ajuda americana anual ao ensino no Paquistão somou apenas US$ 64 milhões, ou US$ 1,16 por criança em idade escolar.[9]
Os autores apontam que “o rumo estratégico para as relações com o Paquistão foi determinado logo cedo por um estreito círculo no alto escalão do governo Bush e tem se concentrado predominantemente no esforço bélico, em lugar de tomar como alvo a situação interna paquistanesa”. Cohen e Chollet também enfatizam que o “engajamento americano com o Paquistão é extremamente militarizado e centralizado, e muito pouco beneficia a vasta maioria dos paquistaneses”.
Eles citam George Bush como autor da frase: “Quando [Musharraf] me olha nos olhos e diz ‘o Taleban vai desaparecer e não haverá mais al-Qaeda’, você sabe, eu acredito nele?”[10]
Essa abordagem militarizada está empurrando o mundo para uma espiral descendente de violência e conflitos. Cada novo sistema de armamentos que os americanos “vendem” ou dão à região faz crescer os riscos de guerra mais ampla e de novos golpes militares, e aumenta a probabilidade de que as armas venham a ser apontadas para os próprios EUA.[11]
Nada disso ajuda a atacar os problemas subjacentes à pobreza, mortalidade infantil, escassez de água e ausência de fontes de subsistência em regiões como a Província da Fronteira Noroeste, no Paquistão; a região de Darfur, no Sudão; ou na Somália. É cada vez maior a densidade populacional nesses lugares, onde as pessoas sofrem com chuvas insuficientes e pastagens degradadas. Naturalmente, muitos aderem a causas radicais.[12]
O governo Bush não percebe que esses são problemas demográficos e ambientais fundamentais, que US$ 800 bilhões em gastos com segurança não levarão irrigação ao Afeganistão, Paquistão, Sudão e Somália, e que portanto não produzirão paz. Em vez de enxergar pessoas reais em meio à crise, o governo americano vê caricaturas: um terrorista em cada esquina.
Um mundo mais pacífico será possível somente quando os EUA e outros países começarem a ver a realidade através dos olhos de seus supostos inimigos, e perceberem que os atuais conflitos resultado de impotência e desespero, podem ser resolvidos por meio de desenvolvimento econômico em vez de guerras.[13]
Teremos paz quando dermos ouvido às palavras do presidente John F. Kennedy, que disse, poucos meses antes de sua morte, “pois, em última instância, nosso elo básico mais comum é que todos nós habitamos este pequeno planeta. Todos nós respiramos o mesmo ar. Prezamos o futuro de nossos filhos. E somos todos mortais”.[14]
artigo publicado pelo Jornal da Ciência, SBPC, JC e-mail 3397, de 26 de Novembro de 2007
http://blog.ecodebate.com.br/2007/11/27/a-fracassada-militarizacao-dos-eua-por-jeffrey-d-sachs/

[1] Acho artificial a separação categórica entre “gastos em segurança” e “gastos em desenvolvimento econômico”. Se desenvolver a economia implica em gerar empregos, a segurança não estaria também neste rol de atividades? E, se por “segurança” implica em garantir reservas estratégicas de recursos minerais, como o petróleo, os gastos em segurança não garantem o desenvolvimento econômico?

[2] De uma coisa podemos estar certos: se acabar com os problemas desses países significasse reduzir simplesmente, suas taxas de incremento populacionais, teríamos o menor dos problemas. Bastaria uma ampla campanha de distribuição de anticoncepcionais aliada à orientação de seu uso. Mas, com exceção da Etiópia, todos os países em questão são muçulmanos, com governos mais ou menos fundamentalistas. E mesmo a Etiópia (volta e meia tem cúpulas de orientação marxistas) não é o melhor exemplo de governo pró-ocidental. No curto prazo, para se poder um dia talvez promover o desenvolvimento da maioria das pessoas teria que se anular ou dirimir o poder daqueles que o obstaculizam. Isto é, me refiro às elites plutocráticas ou teocráticas de diversas dessas sociedades. Claro que uma potência, seja ela qual for não vai entrar numa canoa furada de bancar a “Madre Teresa de Calcutá Global” de graça... Não sem garantir certos benefícios em causa própria – aliás, tudo mais ou menos, gira em torno de um cálculo de custo/benefício.
Portanto, como controlar as milícias somalis sem ter que apoiar uma delas e impedir que a guerra étnica ultrapasse fronteiras no Chifre Africano sem fortalecer seu estado vizinho, a Etiópia? Como anular o expansionismo Baath (Iraque) ou os aiatolás (Irã) garantindo estabilidade aos aliados no Golfo Pérsico sem diminuir o poder dos primeiros? Como impedir fundamentalismos crescentes no Paquistão sem o apoio ao governo laico de Musharraf?

[3] As “situações” não se inflamariam por conta própria? Ou só o conseguem graças à influência americana?

[4] Por acaso, o Iraque e a Síria também não eram cortejados pela então URSS? E se os EUA não tivessem apoiado o regime do xá, o que existiria no Irã? Provavelmente, uma ditadura comunista. Ah, se bastasse não investir em armamentos e não apoiar nenhum regime externo... Será que é tudo tão simples assim?

[5] Apoiaram Saddam porque o Irã bloqueou a saída de petroleiros do Golfo; apoiaram o Talebã (e não, pessoalmente, Osama) porque a URSS invadira o Afeganistão; lutaram pouco contra Osama... Nisto erraram, pois se durante o governo Clinton tivessem o atacado sem pudores, talvez evitassem muitos contratempos.

[6] O que significa que o apoio externo não é tudo. Também depende do que o governo apoiado faça, internamente. Como, p.ex., o Paquistão não apoiar os talebãs (que são sua extensão) no Afeganistão.

[7] Em se tratando de assuntos militares, é o Pentágono mesmo quem lidera e não, “agências civis”.

[8] Só o futuro poderá dizer se os gastos militares no Afeganistão, Iraque e Paquistão foram em vão. São projetos de longo prazo. Assim como, só agora podemos ter distanciamento suficiente para entender a Guerra Fria, ainda levaremos algum tempo para julgarmos com propriedade o que está ocorrendo.

[9] A questão é o que o Paquistão fez com 10% em ajuda humanitária. Como os países pobres aplicam os recursos destinados a tais objetivos? Ou será que o simples número fala por si?

[10] Bem... Eu não presto atenção às palavras. Cabe a nós prestar mais atenção aos atos.

[11] E o isolacionismo como política externa também não levaria mais armas a serem apontadas aos EUA? No curto período laureado como “Nova Ordem Mundial” (que parece já ter chegado ao seu fim...), quando o investimento bélico teve uma ligeira estagnação, as guerras etno-tribais na África e Ásia não recrudesceram, igualmente?

[12] Tendências demográficas não serão solucionadas sem uma correspondente adoção e mudança de comportamentos sociais endógenas. Esperar que uma potência estrangeira dê conta de solucionar estes problemas têm como premissa (ingênua) que, realmente, o mundo seja possível ser, politicamente, planificado. Como se os outros povos fossem passiveis de acatar a boa vontade e intenções externas. Darfur mesmo é, claramente, exemplo de como guerras étnicas independem destes movimentos e intenções globais.

[13] Muitos, como o próprio Kennedy foram entusiastas da “política da boa vizinhança” e, no que acabou dando isto? No imediato Pós-Guerra, a América Latina era uma região nevrálgica e recebeu tanto investimentos quanto hoje recebem outras regiões no mundo. Mas, no que deu isto? Se não há um mínimo de vontade (e consciência) política interna, para quais bancos internacionais ou paraísos fiscais vão os recursos?

[14] Belas palavras... Ainda mais quando vindas de um dos principais defensores da permanência das tropas americanas no Vietnã.

* Meus comentários a este artigo se encontram nas notas.

Jogo sírio - 2


Em que pese também o dissenso interno aos sírios, por razões complexas (proximidade étnica, oposição aos EUA e Israel), a Síria apoiou os sunitas na Guerra do Iraque. Se o fundamentalismo sunita se opõe ao secularismo alauita, um fundamentalismo oportunista capitaneado por Damasco seria uma alternativa razoável frente à composição de forças em curso. E aos EUA caberá forçar os sírios a sair do Líbano.

Após os equívocos de Israel no Líbano, os sírios têm se tornado a força dominante no país. A Síria por seu turno criou uma estrutura que estabiliza os arroubos de violência no Líbano, controlando o Hezbollah em seus ataques contra seus aliados no Líbano (muitos dos quais, se opõem ao Hezbollah) e a própria Israel.

Por mais paradoxal que possa parecer, a presença síria no Líbano garante uma estabilidade à Israel e os israelenses não querem a destituição do regime Assad. Ruim com eles, pior sem eles é o que passa na mente dos israelenses. A presença síria no Líbano, apesar de incômoda, é uma garantia a mais pela estabilidade do país. Sim, Israel deseja, sobretudo, o controle do Hezbollah.

Aqui temos, então, um ponto de tensão entre Israel e os EUA, especialmente difícil de entender para aqueles que vêem uma “ligação carnal” entre os dois países, uma dependência e comunhão total de propósitos, o que não passa de mito. Os EUA, por sua vez, preparam-se para punir os Assad por sua interferência no Iraque, o que trará mais instabilidade política à região. Mas, o real perigo na região reside numa possível sucessão síria com fundamentalistas sunitas, uma vez que Damasco os ajudou. Aí é que está o problema.

Para os turcos, este arranjo informal entre Israel e Síria é fraco. Não é a primeira vez que Israel adota esta política. Aliás, já fez o mesmo com o Egito e a Jordânia... No caso específico da Síria, não há como suportar a pressão americana. Para os turcos, o reestabelecimento das antigas tensões é que é desejável. E, novamente outro paradoxo aparente, junto aos EUA contra esta configuração de poder está o Hezbollah e o Irã!

Os EUA vêem a Síria como fator de instabilidade regional, cujo currículo no Líbano a condena. Chutar os Assad poderia ser, militarmente, fácil para Washington, mas os avisos sauditas aos americanos têm que ser, atentamente, levados em consideração... Os lucros do petróleo no Iraque passam, atualmente, pelos sunitas. Por isto, não convém desagradar, mesmo que indiretamente, estes novos sócios.

Apesar da Arábia Saudita, desde os 70, ter os sírios como inimigos e verdadeiro pavor da política iraniana e seu apoio ao Hezbollah, não acredita no controle dos xiitas por Damasco. Mais precisamente, os sauditas acreditam que os sírios controlem o Hezbollah contra Israel, mas não conseguem o mesmo contra os sauditas e demais sunitas. E Washington tem que dançar entre os interesses israelenses e a hostilidade saudita para com Damasco. Não pode se errar o passo, embora haja uma tendência predominante em Washington por “vingar” o governo de Bagdá contra o apoio sírio às milícias sunitas no Iraque.

“Vingança”, como redução de poder de um vizinho inconveniente, bem entendido. Afinal, vingança por vingança não traz poder.

Chega-se, ironicamente, em uma convergência de interesses de Washington, Teerã e o Hezbollah contra Damasco. Quem diria? No entanto, apesar do crescimento da força do Hezbollah sob o dissenso estratégico, ele não consegue se estabelecer como força política convencional e alternativa. Para os sírios, ele é conveniente para ser liberado como cão de guarda no momento oportuno. E, quando este momento chegar, romper as amarras que o prendem a Damasco também jorrará sangue.

Para caminhar nesta selva, urge que acordos com Teerã sejam formados antes que o Hezbollah possa se tornar independente do apoio sírio. Mesmo porque, hoje, o apoio de Teerã ao Hezbollah, passa por Damasco, apesar de todas suas diferenças ideológicas. Depois, para Washington ficará mais fácil jogar com Damasco e Teerã. De preferência, um contra o outro.

Jogo sírio


A Turquia, aliada dos EUA, membro da OTAN não tem interesse nos acordos de paz entre Israel (igualmente aliada americana) e Síria. Não há interesse em uma Síria estável e seu estado fortalecido na fronteira meridional turca. Não há interesse em um novo concorrente regional. Com o crescimento militar turco e a concentração americana no Iraque, um vácuo de poder surgiu na Ásia do Levante, o qual os turcos querem preenchê-lo. E não nos enganemos com justificativas a partir de disputas regionais pretéritas, o envolvimento turco na diplomacia regional é apenas o primeiro passo de uma longa série de ações do que está por vir.

A Síria tem interesse nos planos de assentamentos de Israel. A minoria étnica alauita que governa Damasco é um movimento secular que tem maior afinidade com o Fatah do que com o Hamas (ambos sunitas, porém distintos politicamente) ou com o Hezbollah (xiita). A maioria religiosa sunita do país não determina, portanto, as ações do governo sírio. Não se trata de religião, no sentido etéreo da palavra, mas simples Razão de Estado.

Em que pese a insatisfação geral dos sunitas com o governo sírio, os interesses de Damasco se concentram muito mais na riqueza afluente do Líbano do que em Israel. Dinheiro puro e simples e, não fé é que ditam as regras. Neste contexto, o apoio ao Hezbollah é casual, não uma “ligação carnal”. Damasco joga com todas as fichas disponíveis, não só apoiando os xiitas do Hezbollah, como envia armas aos jihadistas sunitas. Os Assad são políticos habilidosos, mas em que pesem suas táticas para contrabalançar Israel, não têm estratégia visível (ao menos, por enquanto) para lidar com os turcos. E estes não têm uma receita pronta e fácil: se não querem estados fortes, tampouco desejam o caos em sua fronteira sul.

Wednesday, May 21, 2008

Problemática ecológica e percepção global



Embora esta discussão seja oriunda do cenário europeu, normalmente versa sobre o mundo, particularmente os países subdesenvolvidos. E, como não poderia deixar de ser, o “filtro” é terceiro-mundista. Afirmações como 20% da população mundial exploram 80% dos recursos naturais mundiais[1] surgem sem grandes considerações metodológicas. De onde tiraram seus dados? Pressupostos de pesquisa etc? Daí é um pequeno passo a atribuição das sociedades ocidentais como responsabilização por todos males ecológicos. E, como subproduto lógico, a “enorme dívida social para com o Sul...”

“Sul”, bem entendido, nesta tosca divisão geográfica corresponde ao grupo de países subdesenvolvidos do globo. Muito embora, grandes contingentes de miseráveis do globo se encontrem ao norte da linha do Equador, como parte da Índia, China, Ásia Central, norte da África e América Latina.

Há uma grande diferença sim entre cidades do “Primeiro Mundo” e do “Terceiro Mundo”, mas enquanto aquelas têm grandes redes de infra-estrutura desenvolvidas por seus estados e segmentos do setor privado, nossas cidades do bloco subdesenvolvido são amalgamadas por sociedades onde o estado é inoperante e que também sufoca a atividade do setor privado com burocracia excessiva e elevadas cargas de tributos. Raízes distintas deveriam ser o primeiro passo para avaliação de problemas ambientais comuns.

É assaz simplista resumir a “crise ecológica” a um problema energético que demanda soluções tecnológicas, enquanto que grandes potenciais de produção, como os caudalosos rios africanos esperam por financiamentos em obras como hidroelétricas obstaculizadas por organizações ambientalistas radicais como o Greenpeace. É preferível bradar contra um suposto “aquecimento global” e esquecer o drama de dezenas de milhões que sofrem com o mosquito da malária nos trópicos africanos. Drama igualmente produzido por aqueles que são contra inseticidas eficazes como o DDT...

A causa, constantemente anunciada, por tais mentes bem intencionadas se constitui no próprio desenvolvimento dos países ricos. Para elas, trata-se de um “jogo de soma zero” onde os ricos são ricos, justamente, porque “exploram” recursos globais em demasia “causando” a pobreza alheia. Este tipo de mito não considera que o que está (ou deveria estar) em questão é o caminho histórico trilhado pelos países ricos, cujas medidas se analisadas e, devidamente, adaptadas aos pobres seriam de grande valia. Verdadeira valia.

No fundo se trata de uma visão religiosa baseada numa culpa e, não existe culpa sem pecado, neste caso, a luxúria. Se há algo que os cidadãos das modernas sociedades ocidentais podem fazer pelos pobres do mundo, caso entendessem os reais problemas, isto reside na extensão de seu modo de vida. Ou seja, exatamente o contrário do que preconizam as mentes dotadas por uma falsa consciência ecológica. E o comércio livre aliado a medidas antiprotecionistas seria um bom começo...

[1] Hans-Norbert Mayer. “The Social Dimension of Urban Ecology.” In: Breust, Feldmann, Uhlmann (eds.). Urban Ecology. Springer, 1997, p. 204.

Conversa fiada - 2


Os palestinos se distribuem entre West Bank (Cisjordânia) e a Faixa de Gaza no território israelense. Ideologicamente, se dividem em grupos bastante heterogêneos, com o Setor Ocidental (Cisjordânia) controlado pela Aliança Nacional Palestina (ANP), a qual se subdivide em duas facções, o Fatah e o Hamas. O primeiro é, sem dúvida, o mais forte na Cisjordânia e controla as instituições da ANP. Pode-se dizer que o Fatah – na prática – controla o governo palestino oficial. Mesmo em Gaza, onde o Hamas é o grupo hegemônico, o Fatah se mantém com força na disputa.

O Fatah é um movimento secular, originário do esquerdismo árabe dos anos 60 e 70. O Hamas, por sua vez, é guiado por pressupostos religiosos de movimentos sunitas de fins dos 80 e 90. Exceto pela formação do estado palestino, suas visões de estado variam geograficamente. O Fatah mantém seus compromissos com o estado de Israel, o que deriva de certo temor pela expansão da hegemonia política do Hamas entre os palestinos. O Hamas, por sua vez, não tem preparo para um “compromisso geográfico”, isto é, de formação territorial de um estado palestino, exceto em bases temporárias. Estes dados já são suficientes para apontar quem Israel apóia. Não há possibilidade, por parte do estado israelense de travar acordos com aqueles que não aceitam seu direito à existência.

Um dado para contemporização desta relação de forças é que mesmo apresentando divisões internas, Israel não demonstra cisões tão profundas quanto os palestinos. Portanto, a análise do conflito árabe-israelense passa por uma guerra entre três grupos básicos, Israel, Fatah e Hamas, o que torna impossível um acordo definitivo de assentamento entre estas partes levando-se em consideração a crescente aliança entre Israel e Fatah contra o Hamas. O que resta são acordos parciais entre Israel e o Fatah, através da ANP. No entanto, isto não se torna suficiente para estabelecer um pacto interno aos palestinos, ainda mais com o Fatah não fazendo nenhum esforço em negociar com o Hamas. Igualmente, se o presidente palestino Mahmoud Abbas promovesse um amplo assentamento com apoio do Fatah não seria o mesmo que um acordo integral com os palestinos, mas somente com sua facção.

De sua parte, os israelenses têm sinalizado para esmagar lideranças do Hamas em Gaza. Nesta guerra de dissuasão ostensiva e, também psicológica, resta ao Hamas se preparar para operações de contra-insurgência em um ambiente politicamente inóspito. Reduzir a influência do Hamas num primeiro turno pode ser também o início de um processo que aponta para a anulação gradual do próprio Fatah, e de xiitas que apóiam o Hezbollah.

Para Israel pode ser uma vantagem alcançar um acordo de assentamentos com Mahmoud Abbas e lançar ataques em Gaza. O próprio Abbas pode ser o testa-de-ferro de um ataque decisivo ao Hamas, mas isto colocaria a ANP em dificuldades políticas. Por outro lado, os palestinos não mantêm ilusões que um ataque massivo em Gaza eliminaria por completo a capacidade militar do Hamas. Quanto mais mísseis lançados contra Israel, maior se torna a pressão para toda sorte de revides por parte de seu estado.

Realisticamente falando, assentamentos não conduzem, por si só, a nenhum processo de pacificação porque não há plano sustentável de assentamento sem operações de guerra. No horizonte, só se vislumbra a paralisia e uma guerra eliminaria a capacidade do Fatah de atingir seu propalado plano de partilha territorial.

O resto é conversa fiada.

Tuesday, May 20, 2008

A dimensão social da ecologia urbana



Na verdade, há duas dimensões da ecologia. A que nos é dada pela evolução tecnológica, cujas demandas existem por nosso passado urbano que nos deixou solos contaminados, rios poluídos e plantas industriais desocupadas. Cada vez mais, os custos de recuperação e mitigação destes usos passados se avolumam e nos trazem exigências no desenvolvimento de “tecnologias limpas” e técnicas de reciclagem ou minimização de impactos. Por outro lado, a adoção de formas sustentáveis de desenvolvimento urbano é bem mais complexa. Quando falamos em “ecologia urbana” não existem apenas ecossistemas e técnicas neutras, socialmente falando, assunto de exclusiva competência técnica ou instrumentos administrativos e jurídicos que redundem em um planejamento isentos de perspectivas de mudanças sociais e políticas.

Definição de objetivos

O objetivo mais tangível de todos é tentar impedir catástrofes abruptas ou lentas e graduais. Entre eles, o aquecimento local (não, o “global”) através da formação de “ilhas de calor”. E as ciências naturais têm nos enviado sinais, predominantemente, negativos sobre nossas perspectivas de desenvolvimento às expensas do crescente desenvolvimento científico já alcançado.

Por mais que nos desenvolvamos, novas situações ecológicas têm que ser desenvolvidas. As quais nos obrigam a adoção de novos estilos de vida e trabalho. Em suma: a simples explanação dos problemas e situações ambientais não pode, em si só, expor as normativas do desenvolvimento futuro das sociedades se não houver a inclusão de um debate democrático com a sociedade que aponte para um novo modo de vida.