interceptor

Novas mensagens, análises etc. irão se concentrar a partir de agora em interceptor.
O presente blog, Geografia Conservadora servirá mais como arquivo e registro de rascunhos.
a.h

Friday, July 11, 2008

Radar tcheco






O temor da Europa Oriental pela Rússia, uma Rússia em ressurreição, diga-se de passagem... Parte de certo consenso centro-europeu. Sua disseminação conta, atualmente, com a vontade explícita do presidente polonês e do governo lituano.

Washington tranqüiliza Moscou ao dizer que não tem nada a temer com a instalação de um escudo antimíssil na República Tcheca pela Otan, como se fosse apenas um conjunto de medidas defensivas contra o Irã. Mas, se os russos se irritam não é de graça. Obviamente que sua reação – militar e, não meramente diplomática – poderá implicar em um deslocamento de forças convencionais para Kaliningrado e Bielo-Rússia.

A incógnita é se uma futura administração de Obama perpetuará a política Bush (como fará a de McCain) ou se curvará ao tom grosso da voz do Kremlin.


Cf.: NATO Expansion - National Views

Wednesday, July 09, 2008

A Casa de Fenrir: A bússola de Kubrick*


O menor teste político do mundo

Marcus Mayer

Globalismo: questões

Anônimo disse...

Algumas perguntas devem ser feitas aos Doutores, Cientistas ou Filósofos.

1) Qual o nivel de "riqueza" necessário para que todos os habitantes do planeta
convivam em paz.

Não precisa nem ser um valor fixo, pode-se imaginar um +ou-
assim tipo "desvio padrão"?

2) Qual seria o limite de viventes conhecida a capacidade de produção da "casa", o planeta?

3) Qual seria o sistema administrativo dessa "patuléia" para que a paz fosse reinante para sempre?

4) Como seriam escolhidos esses administradores?







Caro anônimo,

Não sou doutor nem filósofo, mas vou responder.

1. Com todo o respeito, trazes uma falsa questão neste primeiro item. O nível de riqueza interfere pouco nos movimentos geopolíticos que levam aos conflitos. A riqueza e o capital constituem um “poder pegajoso”, do qual diversas potências lançaram mão ao longo da história. Mas, que nem por isto deixaram de se ver as voltas com ataques ou necessidade de defesa. Este foi o caso do mundo pós-acordo de Bretton-Woods (com a substituição do padrão ouro pelo dólar) que, por cerca de 30 anos levou a um crescimento econômico geral insofismável. Neste contexto, basta vermos como foi o mundo no pós-guerra e a miríade de guerras em países africanos, dentre outros. Ou, mais próximo, na própria América Latina. A questão é como tais recursos e lucros foram devidamente utilizados. Sua má utilização (e distribuição pelo mercado concentrado) é que é geradora de conflitos. Ou seja, a raiz é política, mais que econômica. Analogamente, os vínculos econômicos da Alemanha com o monopólio marítimo da Inglaterra não impediram aquela de ir à guerra. Ou mesmo, a dependência americana para com a mesma Inglaterra nos anos que antecederam sua independência. Havia, inclusive, lobby americano contrário à guerra, uma vez que já detinha uma situação bastante confortável. E, atualmente, mesmo com todo o dinheiro derivado das exportações do ouro negro, o que mais há na superfície do solo do Oriente Médio são ódio e fundamentalismos.
2. Creio que não há limites. Desde a Conferência de Estocolmo em 1972, na qual foram lançadas as bases da “ecologia política” que se fala em “limites” que nunca chegam, pois a população mundial continua crescendo, assim como seu nível de consumo. O que temos que lidar, sem dúvida, são impactos ambientais, ou seja, externalidades negativas, mas que me parecem plenamente contornáveis conforme avança a tecnologia. O que faz falta às sociedades para deliberar em como usá-la são instituições democráticas firmemente assentadas no solo da sociedade e seu estado de direito. Tradição e cultura dizem mais do que a economia quando se trata de deliberar sobre como aproveitar estes recursos. Sem elas, os impulsos demográficos levam, inexoravelmente, a uma situação hobbesiana de guerra de todos contra todos.
3. Creio ter indicado que sistema seria este no item anterior. A democracia, em que pesem seus defeitos e vícios regionais, ainda é o melhor sistema. Mormente, detalhes técnicos precisam ser assegurados, como a transparência social, especialmente a institucional sobre a oferta e funcionalidade dos serviços públicos. Só isto já faria um bem enorme.
4. Não sei, mas acho que a escolha não é tão fundamental como a opção de poder retirá-los quando nos for conveniente. O sistema público teria algo a aprender com os mecanismos da economia de mercado. No caso, a estabilidade do servidor público teria que ser abolida, bem como forçar uma revisão criteriosa sobre a legislação trabalhista.

Tuesday, July 08, 2008

Globalismo - 1

Globalismo, o que diabos é isto?*






Dias atrás assistia a um seminário sobre o movimento internacional de ongs destinado a atacar de forma virulenta a soberania nacional, as bases econômicas liberais e nossa tradição cultural e religiosa. Era unânime entre os expositores a acusação de que a ONU é o principal organismo internacional com interesses escusos nesta empreitada de significado histórico. Ao final, no debate, um aluno colocou uma questão que, para mim, resumiu toda a fragilidade da tese globalista, do domínio e hegemonia mundial sob auspícios da ONU. Vou puxar de memória:




Meus professores de cursinho eram todos esquerdistas, principalmente os de geografia e história e, eles diziam a mesma coisa de vocês, só que ao invés de afirmar que havia uma conspiração mundial “de esquerda”, ela era “de direita”.
Quer dizer... Que ao invés de dominar o mundo com ações da ONU, a ONU era submissa aos interesses dos países ricos e suas corporações mundiais. No fundo era o mesmo argumento de vocês, só que com conclusões opostas. Em vez de trazer o socialismo, elas estariam garantindo o capitalismo e monopólio mundial.
Agora, eu fiquei na dúvida, quem é que tem razão?





Estes são dos bons... Sempre gostei de alunos que me desafiavam. Para mim, um round se passara e a próxima aula seria uma demonstração de que eu estaria certo e, para tanto, tinha que me preparar. Mas, lá viria novamente o mesmo insistente e teimoso aluno com novas e novas considerações que me deixariam atônito. Boas aulas contêm dúvidas e motivação para o próximo capítulo. Mesmo quando eu tinha uma resposta ensaiada, sua inconsistência me atormentava durante anos e, lá me via, tempos depois concordando com o querelante.

Agora, eu vou bancar o aluno chato.

Por trás das ações coordenadas em nível mundial e sua declarada agenda de boas intenções, em uma conspiração a portas abertas (!) estaria a ONU e suas várias agências apoiando constelações hierarquicamente descendentes de ongs. Seu objetivo: reduzir a soberania nacional, especialmente dos EUA, na medida inversa em que finca os pilares de um “governo mundial” no coração de territórios outrora separados por nítidas e irretorquíveis fronteiras.

Em tese, isto estaria ocorrendo sem que percebêssemos o real perigo da situação, encantados que estamos pelo canto da sereia de uma sociedade justa e igualitária. Porém, se observarmos como as coisas realmente funcionam, a teoria do “globalismo” mais parece um boneco de palha. Como o globalismo é visto como um processo em pleno curso, outros exercícios de futurologia podem ser aventados para confrontar sua suposta eficácia. Permita-me utilizar do mesmo recurso de seus teóricos, a “arte do chute”...


Cenários possíveis

O Conselho de Segurança (CS) da ONU pode sofrer modificações nos próximos anos. A UE poderá substituir a França e o Reino Unido, caso sua constituição européia venha a ser consolidada. Um outro equilíbrio de forças se avizinha no horizonte histórico com os já garantidos assentos à China, EUA e Rússia. África do Sul, Brasil, Índia e Japão também são candidatos viáveis a membros permanentes do CS.

As alianças militares poderão ser ampliadas, como ocorre atualmente com a Otan rumo ao leste europeu. A Rússia, através de sua Comunidade dos Estados Independentes, CEI (não tão independentes assim) poderá reincorporar a Bielorrússia. Como contrapeso ao tacão russo, as ex-repúblicas soviéticas da Ásia Central (do Cazaquistão ao Afeganistão) procurariam reforçar alguma aliança. Outra interessante aliança que funciona como filial americana neste rimland continental é a do Sudeste Asiático que vai do Paquistão à Oceania, sobretudo, Austrália e Nova Zelândia. Tradicionais aliados americanos para conter a expansão russa ao sul. Esta, na verdade, uma reedição do que já ocorrera na Guerra Fria. Outros problemas às forças ocidentais se formarão com a evolução da Liga Árabe (não “tão árabe”, caso venha abarcar o Irã), o que levaria a concentração dos maiores esforços ocidentais, sobretudo americanos, mais do que os da Otan. E só a manutenção da estabilidade do Iraque e acordos com o Irã já serão suficientes para manter o Pentágono ocupado, seja McCain ou Obama o novo presidente. Uma Otan, por sua vez, já estará suficientemente ocupada com as investidas do “urso russo” na Europa Oriental e suas ameaças de embargo de combustíveis à Europa Ocidental. Ameaças apenas, pois se a Rússia detém o precioso recurso, os ocidentais são clientes indispensáveis. O que, em outras palavras, pode significar um relativo isolamento de Washington. A Organização da Unidade Africana (OUA) continuará uma mera quimera, cujo continente tem sido o maior celeiro de guerras civis no globo. Falar em “globalismo”, no sentido de uma ordem global centralmente conduzida e bem sucedida, neste cenário é coisa para quem abusa da liberdade de imaginação... No continente americano teremos a união indelével entre Canadá e EUA, mas com o “acorde dissonante” do México oscilando entre a atração econômica do norte e seu atrasado sul (Chiapas, p.ex.). Bem como a reserva de mão de obra na fronteira norte, contígua ao sudoeste americano. E a América Central continuará sendo assediada por Washington. A “sala de treino” em stand-by permanece na América do Sul, com um Brasil periclitante nas relações externas, mas com a consciência de possíveis sanções americanas contra “estados-pária” da Argentina, Bolívia e Venezuela a sinalizar as políticas do Planalto Central. A China permaneceria, contida em si mesma, um universo à parte que ainda terá que se definir melhor neste cenário global do ponto de vista político.

É fácil imaginar uma teoria contrária e nada inverossímil. Se tais considerações parecem gratuitas, qual a base empírica das assertivas que afirmam o contrário de modo igualmente voluntarista?


Demandas globais

Se a ONU é um organismo tão ruim que visa prejudicar os povos diminuindo sua capacidade de autodeterminação, porque tantos governos a apóiam? Se a pedra de toque do “globalismo” não se sustenta sozinha, algo não faz sentido. Mas, ainda assim vejamos como esta organização tem asseverado seus “tentáculos hegemônicos” sobre o globo.

Seis países sul-americanos, três centro-americanos, dois norte-americanos, dez países asiáticos, a Rússia, a U.E. e outros europeus não-membros, 17 africanos apóiam a organização, financeira, logística e militarmente. Chega a ser hilário pensar que é de “cima para baixo” que ocorre a influência. É justamente o contrário que se dá. Talvez seja na própria miríade de estados que tentam alcançar uma coordenação e organicidade, a razão da maior inoperância da ONU. Muito chefe pra pouco índio...

Nos anos 90 tivemos 16 ações com tropas da ONU para intervir nos casos de desastres naturais. Como sabemos, não são “tropas independentes”, mas mantidas através de contribuições dos países que a sustentam. Onde está o “globalismo”? Trata-se de uma ação calculada que busca otimizar ações ao redor do mundo, inclusive por estados concorrentes em influência e hegemonia global.

No mesmo período, se contarmos as intervenções para conter atividades guerrilheiras e/ou terroristas foram 21, ou seja, superando com vantagem os danos causados por forças naturais. Isto, antes de 2001, o que significa que esta discrepância tende a aumentar, com maior número de esforços conjuntos para deter este estado de anarquia. Bem que podíamos ter um pouquinho de “globalismo”... Digo, ordem.

Também tivemos 14 operações das tropas no período no papel de “forças de paz” ou ocupação, termo muito mais direto e sincero, como é do meu gosto. Se pensarmos no conjunto, as ações militares contabilizam mais que o dobro às destinadas a amenizar os efeitos das forças naturais.

Não há logística mundial suficiente para sustentar estratégias que levem a um domínio coeso de um pequeno grupo sobre bilhões. Nem sinergia de “metacapitalistas” (capitalistas que devido ao seu poder e monopólio estariam criando um mundo sob o escrutínio de sua “engenharia social” por intermédio da ONU) contra os interesses de dezenas de países e centenas de elites oligárquicas e suas burocracias. Desconsiderar isto significa comprar o mesmo erro marxista de ignorar o estado e suas ramificações internas como dotadas de interesses e vontade próprias. Dentre os inúmeros erros dos marxistas, este contribuiu sobremaneira para sepultar seus intentos revolucionários de acordo com a teoria marxiana, mundo afora perante a perenidade (e necessidade) dos estamentos burocráticos. Analogamente, a suposição de um conluio ONU-metacapitalismo trabalha com um “marxismo de sinal invertido” ao tomar os sintomas de funcionamento de um mercado imperfeito, como objetivos expressos de uma política global e as políticas de contenção de conflitos como expressão de ganho e sustentação das corporações quando, justamente, as próprias mega-empresas é que são ameaçadas em cenários nacionais conturbados por guerrilhas e insurgências várias. O marxismo aí reside na visão de uma “necessidade” e porvir que se implantarão de um jeito ou de outro, uma fé no “destino histórico” desejado pelos marxistas, amaldiçoado pelos teóricos do globalismo, mas que não passa de uma mesma fé social-evolucionista. Uma fé otimista ou pessimista não deixa de ser uma fé que não se põe à prova.

A idéia de que um movimento globalista seja a “face do mal” da globalização se encontra amplamente disseminada, não só entre a dita esquerda, mas cada vez mais por uma auto-proclamada direita que, de liberal, não tem quase nada. Tais “direitistas” podem até defender o liberalismo, mas não usam métodos de análise desenvolvidos por liberais. Na medida em que temem o avanço do capitalismo mundial e, equivocadamente, concluem que este decorre de um arranjo previsto e pré-determinado, o caos e anarquia política são vendidos como uma contraproducente planificação.

Se para evitar os malefícios da ONU, dos quais não duvido que existam, tenhamos que acabar com a própria instituição e suas ações de contenção da barbárie, se para sanar imperfeições de mercado tenhamos que acabar com o próprio mercado, o imaginário super-estado global terá que ceder lugar a estados nacionais cada vez mais repressivos. A título de conter o avanço de forças destruidoras de nossas sociedades, não duvido que seu remédio possa ser mais amargo que a doença levando o enfermo a própria morte.




Fontes:

1. Ian Pearson, Atlas of the Future, New York: Macmillan, 1998.
2. International Institute for Strategic Studies (IISS), The Military Balance 1996-97, London: IISS, 1997.
3. Stockholm International Peace Research Institute (SIPRI), Yearbook, New York and Oxford: Oxford University Press, various dates.

* Versão original deste artigo: Globalismo?