Duas das seis questões do vestibular da Fatec correspondem aos clichês anticapitalistas recorrentes nas provas de geografia. Vamos a elas:
O gabarito “D” que avalia nosso “crescimento desenfreado” é consensual, embora seja totalmente incógnito o que seria um “crescimento equilibrado” ou sustentável. O que sabemos (ou intuímos) são caminhos de maior sustentabilidade ambiental, mas ao se presumir o que é que seria equilibrado, sustentável etc. se tem como premissa o que não o é, como nas alternativas “A” e “B”. Na primeira alternativa fica a dúvida: se mantivermos os atuais patamares de produção e consumo estamos na rota da auto-destruição. Então, a única solução seria reduzir a produção e o consumo com o ônus de perder empregos. Se, a alternativa permanece errada se infere que justamente o oposto está correto, o que decorre em catástrofe econômica. Resta dizer que muitos ambientalistas, mais pragmáticos não concordariam com isto, ao propor formas alternativas de produção “limpas” etc.
A segunda alternativa dá uma indireta ao capitalismo, uma vez que seu ritmo de produção seria mais rápido que processos biológicos e geológicos. Fica aqui subtendido que a rapidez como algo pernicioso, o que, na verdade, é algo perfeitamente normal, já que somos seres com expectativa de vida bem menor que ecossistemas que levam milênios para se extinguir e modificar naturalmente.
E a “E” é estúpida, como se a preocupação ambiental não fosse algo levado a sério por vários governos, nem figurasse como política pública. O que os autores da questão querem? Mais exigências para licenciamentos ambientais que levam anos?
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Nesta questão prestemos atenção ao item “III” da alternativa (correta) “C” e o item “IV”. Primeiro porque um dos “elementos em jogo no processo de globalização” seria a divisão mundial do trabalho entre centros hegemônicos e periferias e semiperiferias. Ora, que divisão, cara pálida? A globalização possibilita verdadeiras inversões. Pelo modelo cepalino de centro-periferia, a China, bem como diversos centros produtivos asiáticos (Coréia, Taiwan...) “deveriam” ser meros receptáculos de manufaturados e exportadores de matérias-primas, mas não é o que ocorre. Se não podemos (ainda) dizer que a China se configura em um grande mercado consumidor aos produtos manufaturados em termos proporcionais, isto não significa que mudanças neste sentido não estejam em curso no país. Mudanças que apontam para o que já ocorreu nos Tigres Asiáticos e, anteriormente, no Japão. Logo, se a idéia subjacente do item III é criar um mundo fictício em que países são determinados a ficarem com seu status diminuído perante uma ordem global, não encontra eco na realidade. Aliás, foi graças às reservas externas chinesas e do Oriente Médio que os EUA não foram tão afetados pela crise de 2008 como se esperava. Na verdade, o que está presumido nesta afirmação é um jogo de soma zero onde um perde para outro ganhar, o que é uma mentira tosca: no cômputo de longo prazo, a maioria ganha e quem perde é quem não se adaptou fazendo sua “lição de casa”, i.e., tomando as devidas precauções para criar uma economia segura aos fluxos de capitais e cada vez mais integrada comercialmente lhe servindo de lastro.
O item IV, claramente, indica que o capitalismo não apresenta alternativa nenhuma de desenvolvimento sustentável, como se toda e qualquer meta de governo e de milhares de empresas não caminhassem no sentido de se tornarem mais responsáveis ambientalmente. Em países como o Brasil, as Reservas Particulares do Patrimônio Nacional (RPPNs) têm sido apontadas como eficazes, em contraposição ao descaso destinado às áreas públicas e cresce a demanda por serviços com menores “pegadas ecológicas”. Não se trata de um otimismo cego de minha parte, mas de constatação de mudança de rumos. Independente de haver ou não certos processos negativos em termos ambientais, como é o caso do AGA, há sim uma maior conscientização ecológica e mudanças do mercado. Verdade que estão longe do que pode se considerar como ideais, mas há inclusive uma atuação mais eficaz de órgãos como os ministérios públicos na fiscalização, repressão e mitigação de danos. Do jeito que o assunto, complexo, está exposto nesta simplificação, modelos alternativos, como o socialista, nunca teriam produzido monstros como o ocorrido no Mar de Aral e em Chernobyl...
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