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a.h

Saturday, August 21, 2010

Bali

O massacre dos surfistas


Terror mata 200 jovens
no paraíso turístico de Bali

José Eduardo Barella e Gabriela Carelli

 
Fotos AP
Corpos das vítimas à espera de identificação e a fuga dos turistas em meio à destruição

Nas últimas três décadas, Bali fez fama como um paraíso zen em meio ao caldeirão muçulmano que predomina na Indonésia – um arquipélago de 17.500 ilhas e 210 milhões de habitantes encravado no Sudeste Asiático. Suas praias deslumbrantes e de ondas perfeitas atraem surfistas e visitantes do mundo inteiro. A hospitalidade de sua população de maioria hinduísta completa a fórmula que transformou a ilha de Bali numa meca do turismo mundial. Na noite de sábado 12, a explosão de duas bombas simultâneas nos bares mais freqüentados pelos turistas, um de frente para o outro, deixou 200 mortos e abriu uma nova frente na ofensiva terrorista em nome de Alá. Foi a maior matança desde os atentados de 11 de setembro, nos Estados Unidos. Entre os mortos e os cerca de 300 feridos havia turistas de mais de vinte países, a maioria australianos e quase todos jovens. Mais de 100 pessoas estavam desaparecidas até o fim da semana passada, incluindo dois brasileiros – o terapeuta paulista Alexandre Watake e o sargento gaúcho Marco Antonio Farias, que servia nas forças de paz da ONU no Timor Leste, país vizinho à Indonésia.
O número de vítimas brasileiras só não foi maior porque a pequena colônia de meia centena de surfistas e comerciantes participava em peso da inauguração da filial da Sandpiper, loja de roupas com sede no Rio de Janeiro, a 50 metros do Sari Club, o local mais atingido pelo atentado. "As pessoas saíam do Sari Club completamente desfiguradas, algumas não tinham braços, outras estavam inteiramente queimadas", contou a VEJA Made de Coney, de 23 anos, dona de uma empresa que exporta artesanato para o Brasil. "Vi um rapaz andando, com parte do cérebro exposta e a pele derretendo. Em vez de ajudá-lo, as pessoas entravam em pânico e fugiam dele." O ataque ao balneário era uma tragédia anunciada. Bali, que recebe 3 milhões de turistas por ano, o dobro dos estrangeiros que visitam o Rio de Janeiro, era um alvo irresistível para aqueles que se consideram soldados numa guerra santa contra o Ocidente. O Sudeste Asiático é um ninho de terroristas islâmicos. Nos últimos meses, o terrorismo islâmico atacou em várias partes da Indonésia. Na semana passada, bombas fizeram dez mortos nas Filipinas, país ao qual os Estados Unidos já ofereceram tropas para ajudar no combate a um grupo guerrilheiro muçulmano, o Abu Sayyaf.
O ataque a Bali revela uma tendência alarmante. Primeiro, devido à sofisticação técnica dos explosivos e à enormidade da matança, bem diferentes de ataques prévios na região. Depois, por atingir turistas estrangeiros, e não desafetos locais, como de hábito. Assassinar visitantes ocidentais, estratégia inaugurada pelos fundamentalistas egípcios no início dos anos 90, parece ser agora a palavra de ordem na Al Qaeda, a organização terrorista do saudita Osama bin Laden. Há poucos meses, um ônibus lotado de turistas alemães foi chacinado num ataque a uma sinagoga na Tunísia. O que aconteceu em Bali mostra que estava enganado quem acreditou que o mundo continuaria o mesmo depois de 11 de setembro e que a guerra contra o terror era um problema exclusivo dos americanos. Os vínculos com a Al Qaeda no ataque a Bali são evidentes. Há indícios de que se tratou de uma operação conjunta entre terroristas locais e internacionais. No mesmo momento em que o Sari Club ia pelos ares, uma bomba explodia diante do consulado americano, a 15 quilômetros de distância do local, numa ação coordenada. Também não parece ser coincidência o fato de o atentado em Bali ter ocorrido no dia em que completava dois anos do ataque da Al Qaeda ao contratorpedeiro americano USS Cole, no Iêmen, em que morreram dezessete marinheiros.
A Indonésia é o país com maior população muçulmana e também um saco de gatos de mais de 300 grupos étnicos e conflitos separatistas em uma dúzia de lugares. Há meses os Estados Unidos, que consideram o Sudeste Asiático como uma peça fundamental na guerra ao terrorismo, vinham advertindo ao governo indonésio que a Al Qaeda tentava estabelecer bases no país. Mas a presidente Megawati Sukarnoputri recusava-se a agir, com medo de provocar a ira dos fundamentalistas islâmicos que abertamente exortam a turba a atacar igrejas ou defendem Osama bin Laden. Depois do atentado, Megawati mandou a polícia investigar os extremistas islâmicos e mudou a lei para condenar à morte os envolvidos em atentados terroristas.
Os indonésios tradicionalmente praticam uma forma moderada de islamismo. A maioria hinduísta de Bali sempre conviveu pacificamente com os muçulmanos. Nos últimos anos, as relações azedaram com a chegada de javaneses, favelados vindos da ilha principal, onde fica a capital, Jacarta. São eles que assaltam turistas e estupram estrangeiras na saída das danceterias, violência que estava arruinando o charme do lugar. Foi justamente o espírito pacífico dos hindus, aliado a uma paisagem exuberante, que transformou Bali num paraíso turístico. A ilha, cortada por uma cadeia de vulcões que atingem 3.000 metros de altura, intercala montanhas impressionantes com praias belíssimas. Nos anos 70, ali foram construídos os primeiros resorts de luxo, que depois seriam copiados em outros países tropicais. Os aventureiros – surfistas, mochileiros e alternativos em geral – chegaram depois de erguida uma infra-estrutura para o turismo dos endinheirados. Para pagar a viagem, surfistas brasileiros levavam o artesanato local para vender em casa, nos anos 80. Os produtos fizeram tanto sucesso que, em 1994, foram vendidas, a preço de banana, 1 milhão de cangas importadas de Bali nas praias do Rio. Neste ano, importaram-se 200.000 dólares em artesanato indonésio. É difícil imaginar que um dia a vida – e os turistas – voltem ao normal em Bali. 
http://veja.abril.com.br/231002/p_092.html

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