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a.h

Monday, September 15, 2008

Lenda Urbana


Anselmo Heidrich[*]

Em Inchaço da Capital[1], Oswaldo Furlan fala em nome dos moradores da Bacia do Itacorubi, importante bairro de Florianópolis. Sua indignação tem razões legítimas. Argumenta que o caos urbano está relacionado à saturação viária, escassez hídrica e energética e déficit sanitário. No entanto, sua análise é equivocada.

A culpa pela atual conjuntura, no seu modo de ver, não poderia deixar de ser outra. Atribui aos “especuladores imobiliários” a responsabilidade última por tudo que acontece. Mas, uma dúvida me ocorre... Quem faz o bairro crescer sem planejamento e controle?

Com uma população de 45.000 habitantes e outros 45.000 cidadãos que, diariamente, circulam no bairro[2], o Itacorubi tem intensa utilização de seu ambiente para as necessidades urbanas. A construção civil e os serviços imobiliários correspondem a uma parcela dos agentes que o incrementam. Portanto, descontextualizar a análise serve se não para fins políticos, para qualquer coisa que não a correta descrição do que realmente ocorre neste espaço particular.

Na rede hidrográfica da microbacia do Rio Itacorubi se encontram afluentes assoreados e poluídos que resulta de uma ocupação sem rede de esgotos, mas com fossas sépticas. Quem constrói fossas e não se preocupa em conectar seus esgotos domésticos a rede de esgotamento sanitário quando existente?

No Itacorubi, mais de 62% das quadras são localizadas em áreas irregulares e 32% estão em declividade acima de 16%, quase 30% em áreas a menos de 30 metros dos leitos fluviais etc. Por fim, apenas 37% estão situados em áreas adequadas do ponto de vista urbano.

O que isto significa? Que cabe a ocupação irregular do solo, a maior parcela de adensamento e ocupação urbana neste espaço em particular.

Portanto, se devemos “suspender” algum tipo de causa de degeneração ambiental, não deve ser justamente contra quem já tem todas as medidas jurídicas previamente tomadas antes da construção. Se a lei atualmente em vigor é insuficiente ou defasada, ela deve ser objeto de retificação via Câmara de Vereadores e não, por lobbistas da “participação popular” que, sob a desculpa de representarem a “sociedade civil” falam em nome da imensa maioria da população que depende da economia de serviços e seu mercado.

Aplicar multas às construções irregulares, sim. Lei para todos significa regularizar a propriedade, mas não punir aqueles que procuram se adequar e se esforçam para pagar todos seus tributos e ônus que lhe são, constantemente, infligidos.

No meu dicionário, responsabilizar um setor e, justamente, aquele que trabalha legalmente por todo um processo acumulativo de irregularidades é, no mínimo, desinformação, mito ou mais uma “lenda urbana” que de nada serve à construção da cidadania.


[1] Artigo publicado no Diário Catarinense de 05 de julho de 2008.

[2] PINTO; STEFFENS; OLIVEIRA. Análise Físico-Ambiental Urbana da
Microbacia do Rio Itacorubi, Florianópolis – SC, visando o uso de Software SIG
.
UFSC/UDESC: Anais XIII Simpósio Brasileiro de Sensoriamento Remoto, Florianópolis, Brasil, 21-26 abril 2007, INPE, p. 3011-3018.
<http://marte.dpi.inpe.br/col/dpi.inpe.br/sbsr@80/2006/11.14.14.29/doc/3011-3018.pdf>, acessado em 15 de setembro de 2008.


[*] Professor de Geografia e mestrando em Geografia Humana pela Universidade de São Paulo.

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