Susan Kaufman Purcell
Diretora do Centro de Política Hemisférica,Universidade de Miami
Já faz algum tempo que os analistas falam de “duas esquerdas” na América Latina. Uma delas está composta de presidentes de tendência social-democrata com condutas democráticas e programas políticos e econômicos que nos lembram os dos países social-democratas europeus. A outra tendência corresponde a caudilhos populistas que, apesar de terem sido eleitos democraticamente, se aproveitaram das regras do jogo democrático para centralizar o poder e a economia em suas mãos. Os atuais governos do Brasil e do Chile são exemplos da primeira tendência e os da Venezuela e da Bolívia, da segunda.
Essa diferença entre as duas esquerdas permitiu à América Latina e aos Estados Unidos deixar para trás a velha noção de que os governos de esquerda são inimigos da democracia e das economias de mercado e, por isso, dos interesses dos Estados Unidos. Entretanto, esse foco nos regimes de esquerda perpetuou o estereotipo da Guerra Fria de que os regimes de direita são antidemocráticos, mais próximos de grupos militares e menos interessados no bem-estar dos pobres.
Por sorte, os atuais governos de direita na América Latina foram eleitos democraticamente, e assim se comportam. Os principais exemplos são México e Colômbia. Tal como nos governos social-democratas da região, suas autoridades estão interessadas em fortalecer a democracia e a economia de mercado, impulsionar o crescimento econômico e reduzir a pobreza em seus países. Em outras palavras, as democracias, de esquerda ou de direita, da região hoje têm mais pontos em comum entre si do que com governos caudilho-populistas.
De fato, os caudilho-populistas são uma ameaça tanto para os governos democráticos de direita como para os de esquerda. A imensa e persistente desigualdade de distribuição de renda na América Latina convenceu muitos latino-americanos de que a democracia e as economias de mercado não lhes trouxeram benefícios. Como resultado, sentem-se atraídos por esses carismáticos caudilhos populistas que prometem mudar o status quo e lhes dar o que necessitam em troca de seu apoio político.
A melhor forma de reduzir as desigualdades de renda é fazer com que o sistema político das democracias seja mais transparente e responsável em relação aos pobres e que sejam implementadas políticas que gerem crescimento econômico. Mas isso é mais fácil de dizer que de fazer. O México é um exemplo. O país necessita aumentar com urgência sua produção de gás e petróleo para cobrir a crescente demanda local e melhorar as receitas com as exportações. Isso demandará investimento estrangeiro na Pemex, a petrolífera estatal do país. Muitos pobres no México se opõem a esse plano em parte devido à percepção equivocada de que investimento externo equivale a privatização, e porque acreditam que as privatizações anteriores não os beneficiaram em nada.
Para obter apoio popular para seu plano de reformas, o presidente Felipe Calderón propôs a criação de “bônus cidadãos”, que permitirão a todos os mexicanos, tanto ricos como pobres, possuir uma parte da Pemex e lucrar se a petrolífera se tornar mais produtiva. Em outras palavras, a reforma proposta permitirá a um maior número de mexicanos, incluindo os pobres, compartilhar os benefícios da reforma econômica.
Outro bom exemplo de integração de setores de baixa renda na democracia e nas economias de mercado são os programas implementados no México e no Brasil que provêem ajuda econômica a famílias pobres sempre que enviem seus filhos à escola e ao médico, entre outras condições. De fato, a consciência de que os problemas dos pobres em países democráticos, com governos de esquerda ou de direita, devem ser resolvidos pode ser o único benefício do surgimento dos caudilhos populistas na região.
Por último, as democracias latino-americanas aprenderam que não basta diagnosticar os problemas e trabalhar com a classe política para resolvê-los. Agora sabem que devem envolver aqueles que se opõem às reformas em discussões políticas e explicar repetidamente a toda a população por que elas são necessárias e como serão benéficas para todos. É um grande avanço para as jovens democracias na região. É preciso garantir que os novos participantes no processo político, do segmento de baixa renda, sintam que podem influenciar e tomar decisões com informações que, de uma vez por todas, protejam e promovam seus interesses.
No comments:
Post a Comment