Em O genocídio de Gaza e a natureza expansionista de Israel, Pedro Porfírio faz uma defesa implícita do Hamas (sem o dizer claramente) ao criticar a política e ação militar israelense.
Vamos por partes:
1) Naquelas paragens havia judeus e palestinos. Os dois grupos antes da fundação do Estado de Israel em 1948. No meu modo de entender a coisa, ambos os grupos mereciam ter seu chão naquele semi-árido. Mas, por diversas razões, a coisa degringolou. Se for lícito apontar culpados, em primeiro lugar está a Inglaterra que começou o processo de ocupação e transferência judaica e não o terminou. Em menor medida, a França que mais ao norte detinha a Síria e o Líbano. Estes dois países traíram os árabes, com falsas promessas de terras e a formação de seus estados em troca do apoio na luta contra os turcos, aliados alemães na I Guerra Mundial.
2) O sionismo foi um movimento nacionalista judaico, mas nossa bem pensante e politicamente correta mídia ‘esquece’ de lembrar que os árabes também tinham no período seus movimentos nacionalistas. Que assim como todo ‘nacionalismo’, porta fortes ingredientes xenófobos.
3) O Likud é uma agremiação fundamentalista, isto é, o pior tipo de política que se mistura com religião. Acontece que é a outra face de um movimento oposto, o do fundamentalismo islâmico que seja com o Hamas ou o Hezbollah consegue apoio dos árabes palestinos ou libaneses e sírios. O último com claro apoio do Irã que busca uma união muçulmana. Parece bonito e legítimo, mas ampliando o espectro de análise, este mesmo “bem intencionado” Irã apóia xiitas contra sunitas no Iraque muito antes dos americanos ocuparem o país, como estratégia expansionista. Só que diferentemente dos americanos, Teerã visa incorporação territorial no Iraque...
4) Diferentemente do autor do texto não vejo os israelenses como um “todo-harmônico-judaico”. Há uma parcela moderada que, em outras épocas levou Shimon Perez ao poder contra Benjamin Netanyahu. Ocorre que com a intensificação dos ataques, o sectarismo do lado conservador teve sua chance e se impôs, mesmo após tantas tentativas – orientadas por Clinton entre Itzhak Rabin e Yasser Arafat, o primeiro foi morto por um radical judeu. Ou seja, não haverá paz enquanto os radicais, de ambos os lados reitero, não forem perseguidos e presos, para dizer o mínimo.
5) Óbvio que Obama ajudará Israel. Mais do que os Republicanos, os Democratas estão no partido mais apoiado pela elite judaica. Os judeus não gostam de Ronald Reagans, Bushes e Cia. Estes são muito “de direita” e, para eles e o temor de algo como os movimentos nacionalistas, a la, “nacional-socialistas” (nazis) é um espectro que os ronda suas consciências. Embora, os Republicanos sejam menos ‘coletivistas’ do que os Democratas e não exista hoje, a menor possibilidade de algum movimento deste tipo surgir nos EUA. Acredito que há algo mais aí... Como o vínculo judaico com os bancos que os Republicanos perseguem quando põem o livre-comércio em risco, ao contrário dos Democratas, mais chegados num welfare state que amplia os poderes de estado e seus oligopólios. Quem pensou que o presidente negro seria um terceiro-mundista é porque não conhece o mínimo de política interna americana...
6) Para Washington (algo além da querela entre Republicanos e Democratas), Israel é sua fiel escudeira em um tabuleiro com alianças instáveis. Mas, não existe ringue de boxe com um só lutador. Se formos analisar historicamente, da mesma forma que os EUA tiveram os seus aliados regionais, foi a URSS durante a Guerra Fria. Ambos apoiando ditaduras ou monarquias despóticas. Não há santos e não há revolução comunista ou democracia liberal que legitime, teórica ou praticamente, este tipo de desmando. O que ocorre é a velha Realpolitik em que os interesses de estado falam mais alto e mais forte que ideais bonitos no papel.
7) O conceito de lebensraum – espaço vital – foi criado por Friedrich Ratzel, geógrafo alemão muito antes de Adolf Hitler. Não é uma exclusividade nazista, não senhor. Vemos o mesmo princípio atualmente com o nacionalismo hindu ou com o talebã que persegue etnias minoritárias (não pashtun) no Afeganistão. Ainda, na China contra o Tibet ou na Rússia contra o Cáucaso. E, claro, não seria diferente de tribos africanas, cada uma com seu nível de atrocidade. Seja um Idi Amin apoiado pelos britânicos ou um Mugabe apoiado pela antiga URSS. A longa guerra em Angola, p.ex., teve ingerência dos dois impérios, o russo e o americano. E la nave va... E, antes que eu me esqueça, até os cubanos são acusados pelos africanos...
8) O autor acusa as “grandes potências”, mas estas não extraíram petróleo da Palestina e Israel não tem suficiente para suas necessidades. Não há lógica nesta afirmação que poderia ser utilizada com outras regiões próximas, mas não em Israel. Como eu disse, a criação do “estado binacional” foi uma péssima idéia inglesa seguida por uma, igualmente, péssima administração da ONU que, em meio aos ataques árabes, os judeus criaram seu estado só para si acirrando o problema. A questão é o que deveriam fazer? Voltar para a Europa Oriental? Embora, possível, não era viável e, sinceramente, ingênua para um povo que sempre perdeu e estava cansado de apanhar. Eles viram a “janela de oportunidade” se abrir na linha do tempo e a cruzaram. Para não mais voltar.
9) “Os judeus agem tal como os nazistas”... É uma afirmação recorrente, mas se observarmos corretamente foi a Liga Árabe os atacou em 1948, 1956, 1967 e 1973. Em todos estes conflitos, os judeus sobreviveram, resistiram e ganharam, com exceção da primeira em que não foi uma vitória no sentido militar, mas civil, ganha pela resistência. Após o último ataque (externo) em 1973, a OLP passou a ganhar crédito internacional e ser ouvida com honras de corpo de estado. As negociações poderiam evoluir, não fosse pelo radicalismo de ambos os lados. Ambos os lados...
10) Um detalhe importante: se palestinos se estrepavam sempre, os outros árabes não necessariamente. Com a última guerra ganharam uma enorme vantagem econômica se unindo e elevando (triplicando) o preço do barril de petróleo em 1973. Um meio econômico para se atingir um objetivo político tornara um fim em sim mesmo.
11) O livre-comércio não se pauta mais nas “Sete Irmãs” e companhias árabes, através da OPEP são as maiores interessadas no petróleo regional. São elas que mandam hoje. A questão palestina não lhes diz mais respeito diretamente. Elas poderiam muito bem passar sem isto e sem se importar. Se ocorrem manifestações de apoio, não vão além de alguma verba de apoio aos refugiados e nativos que resistem em suas terras. Mas, ocorre que outro aliado importante dos EUA, contra o Irã, é a Arábia Saudita. Grande parte da Guerra do Iraque se explica por isso, divergências entre seitas muçulmanas que dominam estruturas de estado. Nisto, Israel e os palestinos são, para a maioria dos estados árabes, um problema, uma inconveniência que ninguém quer se envolver diretamente, seja a Arábia Saudita, ou os aliados ocidentais Jordânia e Egito, antigos inimigos. E, nesta lista está, nada mais nada menos que o “novo aliado ocidental”, ex-apologista do terrorismo internacional, General Muamar Khadafi. Este, agora premido pelo desenvolvimento interno líbio trocou de lado. Interessante como são as coisas, quem te viu, quem te vê... Estas lideranças são hipócritas, pois não vão além de palavras de ordem, protestos formais e mera diplomacia. E olha que eles têm muito dinheiro se quisessem, realmente, fazer alguma coisa.
12) Ahmadinejad é outro que só ameaça, mas veja que na crise dos britânicos capturados no Golfo, não demorou a devolvê-los. Mais parece um típico caudilho latino-americano que muito fala e não faz nada. Só está em outro continente... E a Turquia ri com isto, pois disputa o poder regional contra os árabes. Nas nascentes do Tigre e Eufrates (que banha o Iraque e a Síria), suas represas servem também para reter a água deixando iraquianos e sírios na seca, caso precisem jogar com este poder contra seus inimigos (árabes). Na primeira Guerra do Golfo (em 1991) chegaram a por veneno nos filetes de água que corriam bacia abaixo para matarem curdos e iraquianos, enquanto estes sob coordenação de Saddam Hussein utilizavam armas químicas e bacteriológicas contra os mesmos curdos. Interessante esta “união muçulmana”... E, moralmente, nem Turquia, nem Irã e nem a Síria têm crédito e superioridade, uma vez que tratam os curdos de modo pior do que israelenses tratam os palestinos. São os dois pesos e duas medidas... Eles exigem dos judeus, algo que eles próprios não dão a suas minorias: terra e autonomia. Se bem que o último quesito, Israel até que deu...
13) Sinceramente, o escândalo da corrupção envolvendo Olmert, caso não tivesse ocorrido não mudaria em nada a atual situação. Não vejo lógica nisto.
14) Mas, o autor, ao final de sua exposição reconhece que o Hamas atacou o sul de Israel, o estopim da atual crise. Só que não desenvolve o argumento a partir do fato. Fatos... Parecem pouco importantes quando se quer puxar a história lá de trás... Só que a história pode ser vista por vários ângulos porque tem vários ângulos. O que une todos nesta insanidade é que ambos os lados têm como premissa algo que deveria estar fora da política, a religião.
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