Rio, 11/nov/05 – Por sua riqueza de detalhes, transcrevemos na íntegra o artigo de Dennis Avery, publicado em 28 de agosto passado pelo Center for Global Food Issues, onde rebate os argumentos do conhecido biólogo e escritor Jared Diamond apresentado em seu livro mais recente, "Collapse: How Societies Choose to Fail or Succeed".
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O mito do colapso na ilha de Páscoa
Dennis Avery
Jared Diamond e Thor Heyerdahl, autores dos best-selling "Collapse" e "Kon-Tiki" respectivamente, nos passaram uma irresistível lenda sobre o colapso ambiental na ilha de Páscoa, remoto local do Pacífico, famoso por suas enormes cabeças esculpidas em pedra.
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Eles nos disseram que os ilhéus sofreram uma superpopulação e acabaram com as florestas - destruindo suas possibilidades de construir canoas de pesca. A fome resultante detonou o colapso da sociedade, pela guerra civil e o canibalismo.
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Soa como uma parábola ecológica, para nossas próprias sociedades altamente consumidoras. No entanto, os ilhéus nos deixaram alguma informação documentada. As lacunas foram agora devidamente preenchidas pelo antropólogo britânico Benny Pieser, no jornal "Energia e Ambiente".
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Após os europeus descobrirem a ilha em 1722, navios baleeiros costumavam ali parar para obter água fresca e alimento, obter substitutos para tripulação perdida e forçar a diversão com as mulheres locais. Doenças sexualmente transmissíveis se tornaram causa de morte na ilha.
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Em 1805, a escuna americana Nancy realizou o primeiro rapto de escravos na ilha, de 12 homens e 10 mulheres. Em 1862, o Peru iniciou raptos maciços, que capturaram mais de mil ilhéus. Após protestos internacionais, o Peru repatriou cerca de 100 dos escravos sobreviventes. Infelizmente, esses trouxeram consigo a varíola, e a maioria dos ilhéus restantes morreu.
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Na década de 1870, dois comerciantes europeus resolveram deportar os últimos ilhéus para o Tahiti. Queimaram as choças nativas e, por três vezes, destruíram as colheitas de batata doce para forçar os nativos a entrarem nos navios.
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O Chile anexou formalmente a ilha de Páscoa em 1888 e colocou os poucos nativos polinésios remanescentes num campo de concentração com arame farpado, onde permaneceram vigiados até 1964!!
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Será que os ilhéus destruíram todas as suas florestas? As choças nativas estavam cobertas com folhas de palmeira, quando os holandeses ali chegaram em 1722. Numerosos pesquisadores sugerem que as palmeiras desapareceram sob o frio da Pequena Idade do Gelo, mas os dados são incertos.
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Diamond afirma que as florestas haviam desaparecido no século 15, mas ainda durante 400 anos os ilhéus tinham árvores (trimora) com meio metro de diâmetro para canoas pequenas, construção das casas e para rolar as estátuas. Essas ainda estavam sendo transportadas no final do século 19.
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Houve fome? Sim, após a epidemia de sarampo enfraquecer a população, nesse final do século 19. Entretanto, os ilhéus sempre plantaram grandes áreas com bananas, batatas e cana de açúcar. Alguns dos solos mais ricos da ilha - com lagos de água fresca próximos, para irrigação - nunca foram cultivados.
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Os nativos não conseguiam pescar? O oficial da marinha americana W.S.Thomson viveu na ilha na década de 1890. Relatou sobre lagoas repletas de lagostas e caranguejos, que os nativos apanhavam à mão. Torres de vigia de pedra detectavam as muitas tartarugas marinhas, que forneciam ovos e carne. Os ilhéus faziam anzóis de pedra e osso, e redes de pesca de amoreiras. Tinham até temporadas de pesca, para evitar pesca predatória.
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Não há provas de que existiram mais de cerca de 3.000 ilhéus, que os baleeiros encontraram no século 18. A guerra era comum entre os polinésios, com ou sem fome.
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Pieser não encontrou prova histórica ou arqueológica de canibalismo. Isso foi relatado por missionários europeus tardios, que afirmaram ter salvos os nativos de tal degradação.
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A história do eco-colapso é oportuna demais, perfeita demais e longínqua demais num passado não-provado. Por outro lado, qual parte das tomadas de escravos, sífilis, varíola e campos de concentração documentados proporciona uma lição ambiental da ilha de Páscoa para o Primeiro Mundo tecnológico atual?
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Será que Jared Diamond faz parte do coro verde que nos urge a volver a um primitivismo que não pode nos defender de doenças epidêmicas nem de traficantes de escravos?
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(tradução de Yára Müller)
[051111a]
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http://www.alerta.inf.br/11_2005/051111a.htm
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