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Visionário ou vendilhão?
Após fundar o Greenpeace, Patrick Moore virou a casaca e passou a defender tudo que os ecologistas odeiam. Será que ele ficou doido? Ou enxergou o que ninguém viu?
Por Bruno Garattoni
ILUSTRAÇÃO: CÁSSIO BITTENCOURT
A Guerra do Vietnã continua firme. Secretamente, EUA e União Soviética aceleram a corrida armamentista. Estamos em 1971 e o clima é tenso. Mas aí uma turma de pacifistas se junta pra fazer algo nunca visto. Alugam um barco e navegam até o Alasca para protestar contra os testes nucleares americanos.
Incrivelmente, dá certo: pressionado pela opinião pública, o governo interrompe os testes. Os ativistas ganham a atenção do mundo e formam o que viria a se tornar uma superpotência ambiental - o Greenpeace, hoje presente em mais de 40 países.
Um dos tripulantes nessa primeira missão era o canadense Patrick Moore: na época, um hippie com 24 anos e cabelos longos. Três décadas depois, tudo mudou. A Guerra Fria e os hippies estão extintos.
As grandes preocupações são a emissão de poluentes, a comida transgênica e o aquecimento global. Patrick Moore, agora um senhor, também está diferente. E como: hoje defende tudo o que os ecologistas clássicos mais detestam.
Execrado por seus antigos colegas, ele se tornou o inimigo número 1 do Greenpeace: talvez porque, além de ter cometido "traição", defenda com inteligência suas opiniões. Será que ele tem razão? Ou simplesmente se vendeu?
Recentemente, você escreveu: "Fico triste em ver os ativistas ecológicos se equivocando tanto, com informações e prioridades tão erradas". De fato, às vezes ongs ambientalistas são acusadas de agir politicamente, ignorando a ciência. O que aconteceu?
Na década de 1980, o movimento ambiental começou a ficar mais extremista. E existem dois motivos para isso. Primeiro, naquela época a maioria das pessoas já aceitava as nossas propostas (dos ecologistas). Então, a única forma de continuar "do contra", questionando o establishment, era adotar posições mais e mais extremas - eventualmente abandonando a ciência e a lógica.
O outro motivo foi o fim do comunismo. Muitos ativistas políticos de esquerda migraram para o movimento ambientalista. Eles aprenderam a usar termos "verdes" para defender seus projetos - que têm muito mais a ver com anticapitalismo do que com ecologia.
Em 1985, eu era o único diretor do Greenpeace com formação científica, um mestrado em ecologia. Os meus colegas não respeitavam isso e diziam: "Somos todos ecologistas".
Aí você resolveu sair.
Eu estava cansado de ser contra tudo, queria achar soluções para as coisas. Em 1982, ouvi pela primeira vez o termo desenvolvimento sustentável e percebi que esse era o desafio: incorporar ao dia-a-dia os valores ecológicos.
Mas o Greenpeace não estava interessado. Defendi, por exemplo, o cultivo de peixes como alternativa à pesca indiscriminada. Eles não concordaram. Além disso, na época o Greenpeace queria banir o uso de cloro.
Eu disse que a água clorada era o maior avanço na história da saúde pública. Eles não se importaram e iniciaram uma campanha contra o cloro que dura até hoje. Eu não podia continuar numa organização assim.
E hoje? Como você vê o Greenpeace?
O Greepeace influencia muito as políticas públicas. Mas está fazendo mais mal do que bem. Suas campanhas contra alimentos transgênicos, energia nuclear, cloro, criação de peixes em cativeiro e exploração florestal são todas baseadas em medo e desinformação.
Eles dizem que querem reduzir o consumo de combustíveis fósseis - mas aí se opõem às principais alternativas, que são a energia nuclear e a hidrelétrica. Eles falam como se fosse possível resolver tudo com energia solar e eólica - o que é claramente impossível.
Você costuma ser acusado de trair o movimento ecológico, de se vender ao inimigo porque hoje dá consultoria a empresas, inclusive da área nuclear. Você virou a casaca?
Eu não mudei de lado, pois sempre acreditei que nós precisamos equilibrar as necessidades das pessoas com a proteção do ambiente. O que há de errado em ajudar a indústria a vencer desafios ambientais? Afinal é ela, com seus produtos e serviços, que torna a vida civilizada possível. Al Gore e os líderes do Greenpeace vivem com todos os confortos modernos, mas querem que nós voltemos a uma espécie de era pré-industrial.
O aquecimento global é o tema ambiental que mais mobiliza a atenção do público hoje. Na sua opinião, esse é um problema que merece tal importância?
O aquecimento é uma questão importante, merece a nossa atenção. Mas não sou alarmista e não acho correto usar termos como caos ou catástrofe climática. E também não acho possível provar, cientificamente, que os seres humanos são a causa do aquecimento global.
Não é razoável supor que os fatores ambientais que sempre guiaram o clima, durante toda a história da Terra, deixaram de existir - e nós, agora, somos os grandes causadores das mudanças.
As elites políticas estão tentando assustar o público para ganhar controle sobre ele. Na minha opinião pessoal, a maior questão ecológica é a pobreza. Sociedades pobres não conseguem limpar a água que sujam, nem replantar as árvores que cortam.
Mas e os relatórios divulgados recentemente pela ONU? Um deles afirma que, se a temperatura subir 1,5°C, 30% de todas as espécies animais e vegetais correrão perigo de extinção.
Essa afirmação parece absurda. A Terra já foi muito mais quente. Hoje, a temperatura média está em 14,5°C. Por boa parte da história do planeta, chegou a 22°C - nem existia gelo nos pólos. As espécies que hoje estão vivas sobreviveram a esses períodos quentes.
Eu até acho que seria uma boa idéia reduzir o consumo de combustíveis fósseis, mas pela qualidade do ar e por questões geopolíticas, como reduzir o conflito com o Oriente Médio.
Você defende a energia nuclear. Mas o fato é que ela sofre rejeição maciça da sociedade.
O movimento ambiental, especialmente o Greenpeace, foi criado sob o temor de uma guerra nuclear (entre os EUA e a antiga União Soviética). Nós cometemos um erro, que foi tratar a energia nuclear da mesma forma que as armas nucleares - como se fossem parte do mesmo holocausto.
Não faz sentido banir uma tecnologia só porque ela pode ser usada para o mal. Se fosse assim, os humanos jamais teriam usado o fogo. A energia nuclear não sofre rejeição maciça - na verdade ela é cada vez mais aceita em todo o mundo.
Mas e o lixo nuclear, ou a possibilidade de vazamento de radiação?
Atualmente é fácil controlar o lixo nuclear. Ele não vaza, pois não é líquido - é um material sólido envolvido por camadas de metal e concreto. Não escapa para o ambiente, como a poluição produzida pela queima de combustíveis fósseis.
Além disso, creio que o perigo da radioatividade tem sido exagerado, para assustar as pessoas. Todos nós somos expostos e recebemos radiação todos os dias. Mas só altos níveis de radiação são perigosos - e só Chernobyl lançou esses níveis no ambiente até hoje. Nunca mais, porém, existirá um reator tão mal projetado quanto o de Chernobyl.
Você é a favor dos alimentos transgênicos?
Nunca se provou que as plantações geneticamente modificadas façam algum mal à saúde - ou ao ambiente. Pelo contrário, há muitos efeitos positivos, como menos uso de pesticidas, menor exposição do lavrador a produtos químicos, menos erosão do solo. Alguns tipos de transgênicos poderiam acabar com a desnutrição - como o arroz dourado, que incorpora ferro e vitaminas A e E. E essa tecnologia já existe. Mesmo assim, o Greenpeace continua a bloquear a utilização. É um crime contra a humanidade que deveria ser julgado em tribunal internacional. A oposição aos alimentos transgênicos se baseia em ignorância e medo.
Você disse que, para o ambiente, "os automóveis são a tecnologia mais destrutiva já inventada pela humanidade". Como vê o carro a álcool? E o carro a hidrogênio?
O carro a hidrogênio não será viável num futuro próximo, pois há muitos obstáculos técnicos. Já o álcool é uma boa alternativa, pode ser o biocombustível do futuro.
Num de seus textos, você diz que a humanidade deveria consumir mais madeira e que isso faria bem ao planeta. Como assim?
A madeira é a maior fonte de energia renovável que existe. E sua exploração leva ao reflorestamento. O que prejudica as florestas é a agricultura. Quando compramos madeira, estamos estimulando a plantação de mais árvores para satisfazer à demanda. Os países que mais consomem madeira são os que têm as florestas mais saudáveis.
Certo, mas isso não acaba reduzindo a biodiversidade? Afinal, geralmente vários tipos de árvore são derrubados - mas apenas uma espécie é replantada no lugar.
A exploração florestal mexe, sim, com a biodiversidade. Mas, tendo um sistema de áreas intocadas e reservas ecológicas, é possível preservar ao máximo a biodiversidade - e ainda assim ter uma boa produção de madeira.
Os ativistas ecológicos tendem a fazer previsões pessimistas para o futuro. Qual é a sua?
Acho que há motivos para ser otimista. As pessoas estão vivendo mais, e com mais saúde. As espécies não estão desaparecendo no ritmo que os catastrofistas previam. A população mundial deve se estabilizar em 9 bilhões - e nós vamos conseguir alimentar toda essa gente. A tecnologia está ficando mais limpa, mais verde - e as pessoas estão mais conscientes do que nunca sobre o ambiente.
http://planetasustentavel.abril.com.br/noticia/conteudo_249232.shtml
2 comments:
Muito Interessante, mas não sei de q lado estou ...
O Greenpeace mudou muito, mas Patrick também está exagerando...
Aí está um dos caras, juntamente com James Lovelock e Mário Molina, que me incentivou a prestar Engenharia Nuclear.
IAEA, aqui vamos nós!
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